quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Crime continuado

No passado dia 15 de Outubro, um imigrante moldavo foi condenado pelo Tribunal de Portimão a sete anos e seis meses de prisão, pelos crimes de abuso sexual agravado e coacção grave sobre a filha de quatro anos. Insatisfeitos com a pena, o imigrante recorreu para a Relação de Évora afirmando não haver prova produzida e que estaria embriagado, facto pelo qual teria confundido a filha com a mulher e o MP pede a absolvição do condenado, por entender que o caso apresenta dúvidas; o que no ordenamento jurídico português, havendo um caso com dúvida razoável, o arguido deve ser absolvido, cumprindo-se o princípio do "in dubio pro reo". Ou seja, "em dúvida, a favor do arguido". Refuta o MP quanto ao crime de abuso sexual, que, embora os factos tenham ficado provados, o arguido não agiu de forma livre e consciente por se encontrar embriagado; e que quanto ao crime de coacção, não há qualquer elemento que o fundamente.

Quanto ao processo em si, foi dado como provado pelo Colectivo de Juízes, que o arguido colocou a mão na vagina da filha, de quatro anos, e que ejaculou na boca da criança, fazendo-a vomitar; e que o arguido teria dito à filha que lhe cortaria os braços e as pernas se contasse o sucedido. A criança foi ouvida em tribunal, e pelo facto de relatar os acontecimentos de forma envergonhada, entendeu o MP que tal espelha a impossibilidade da menor em descrever as circunstâncias em que se deram os factos.

Entendeu assim o dignissimo MP que há dúvidas quanto aos factos, e que o testemunho da própria criança não deveria ser levado em conta por se encontrar a mesma impossibilitada de descrever os acontecimentos. Ao que parece, tal será pressuposto da vergonha da menina ao contar o que o seu próprio pai lhe fizera, que ainda assim, relatou os acontecimentos. Se a menina não soubesse o que contar nem como, se se contradissesse, se se esquecesse da "história", ainda se poderia pensar que tudo não passaria de uma encenação de vingança entre cônjuges como muito frequentemente acontece. Contudo, ao terem ficado provados os factos em tribunal, onde será que o MP entendeu haver dúvidas, pergunto eu! Talvez se a mão utilizada foi a esquerda ou a direita...

Não se compreende como o MP pode refutar tal posição, benecifiando o pai abusador e não levando em conta o sofrimento de uma criança ofendida por quem devia ser o seu protector.

E como pode um pai pretender invocar um estado de embriagues para justificar a "inocente troca" entre mulher e filha? A ser verdade que estava embriagado, e ter pensado que aquele pequeno corpo fosse de sua esposa, então não teria necessidade de ameaçar que lhe cortava os braços e as pernas caso contasse o sucedido.

Quando o suposto protector falha, deveria ser o Estado e suas entidades, nomeadamente os tribunais a proteger-nos e a fazer justiça, contudo, a vitima continua a ser continuamente ridicularizada e enxovalhada por quem de Direito. Não seria caso para refutar um crime continuado por parte de todo o Estado?!

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