sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Doença terminal vira Reality Show

A juntar ao somatório dos escabrosos Reality Shows existentes, eis que será filmado nos EUA em Janeiro mais um brilhante programa, em que desta vez os participantes serão doentes terminais... Como o prémio em dinheiro já não serviria de muito, cada programa contará a história de um doente terminal e o prémio será facultar ao doente, a possibilidade de concretizar a aventura da sua vida como desejo final.

A ideia, dizem os produtores, será valorizar a vida e a dignidade humana, celebrando as mesmas e não dar prevalência à morte e ao facto da pessoa estar a definhar diariamente num pesaroso e moroso caminhar para o cemitério.
Ora, não se pode compreender como o mostrar publicamente o dia a dia de um doente terminal, sem qualquer privacidade e padecendo de inúmeras incapacidades, poderá alguma vez constituir um modo de dignificar a pessoa, e de relatar a sua experiência de vida como meio de consciencialização para a dor física, psicológica e problemas enfrentados diariamente. O que espanta é a capacidade de se transformar a curiosidade mórbida de alguns em razões de alta dignificação e preocupação, para se conseguir convencer pessoas que já de si se encontram fragilizadas, a exporem a sua família e sofrimento na praça pública.
Se a preocupação é assim tanta, porque não visitar estes doentes e acompanhá-los bem como às suas famílias, na sua privacidade, proporcionando-lhes o máximo de conforto e saber como lidam com a sua morte "anunciada"? Porque não conhecer as suas necessidades e desejos - e até mesmo tentar concretizá-las, privadamente - em vez de fazer da doença um Reality Show de nível nacional ou mesmo, internacional? Porquê transformar a morte de alguém em programa "fantástico" e de "espectacularismo"? Será que a preocupação pelo doente e sua família ainda vai perdurar após a morte do doente?! Ou o "circo" termina com a «última aventura»?
Assim se vê como a mente humana consegue descer níveis muito baixos, passando por cima de toda e qualquer espécie de consideração humana, baseando-se nessa mesma consideração...só que contudo, numa visão muito deturpada.
É o mexer com vidas e sentimentos a todo o custo, desde que faça render e beneficie alguém, justificando tal acto como algo dignificante e heróico não só para o doente como para a estação televisiva. Talvez fosse melhor fazer uma reportagem sobre estas pessoas e o modo como vivem a sua doença e o «prazo» de vida estipulado pela mesma, em vez de se pretender satisfazer a ganância escondida dos milhões ganhos pelas audiências.
Para outros - leia-se entidades com poder de decisão sobre o conteúdo dos programas televisivos - talvez a ideia aqui subjacente, à semelhança das politicas prisionais de diminuir a população prisional e combater a sobrelotação das prisões, seja a de libertar vagas nos hospitais...

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