terça-feira, 30 de outubro de 2007

Vazio de Alma

A brincadeira teve inicio no Domingo, 28 de Outubro, no exterior do café Regional, Covilhã, quando quatro homens, entre eles dois adolescentes e um deficiente de 49 anos, depois de beberem dezenas de martinis, juntamente com João Inácio, de 42 anos, decidiram ir buscar cordões em 'nylon' para amarrarem este último - a perna esquerda à grade da janela do café, o braço direito a uma vitrina, a perna direita à jante de um carro que estava estacionado no local e a mão esquerda atada à perna direita. Felizes da vida com a brincadeira, foram embora tendo cada um seguido o seu caminho para o conforto dos seus lares. João Inácio, asmático, terá ficado com os braços cruzados e apertados sobre o peito e pescoço, sem capacidade para respirar, o que lhe terá provocado asfixia por vómito. Foi descoberto, já sem vida, por volta das 06h20 de segunda-feira. A autópsia realizada ao corpo, revelou que o falecido, estaria embriagado e com intoxicação alcoólica, e que ao tentar vomitar terá morrido asfixiado pelo próprio vómito, por se encontrar imobilizado e não se conseguir movimentar. Os suspeitos foram conduzidos ao Tribunal Judicial da Covilhã, de onde saíram em prisão preventiva indiciados por homicídio qualificado.

Assim terminou mais uma inocente brincadeira, de meninos bem comportados e conceituados da terra, que nunca fariam mal a ninguém. Designados de meninos, filhos da terra, mas capazes de tamanha crueldade e perversidade.

Fico a pensar no que levará um grupo de jovens a desrespeitar de tal forma a vida humana, como será possível terem sequer pensado em amarrar alguém e ainda por isso, alguém embriagado sem defesa nem reacção. E pior ainda, como será que foram capazes de seguir para suas casas e dormir descansados, sem se preocuparem com o que haviam feito, e em como estaria João Inácio. Totalmente inaceitável, sendo que um dos jovens, teria sedo seminarista. Pergunto-me eu porque será que a Igreja achou que este jovem não teria vocação... e como pôde o mesmo jovem seguir a brincadeira dos restantes... E assim, cada um seguiu o seu caminho, em total desconsideração pela vida humana; num vã gozo por quem deixaram em sofrimento até à morte. Exactamente o mesmo sentimento que teve o grupo de jovens que decidiu "brincar" com o travesti do Porto, quando após lhe baterem, o deixaram no fundo de um poço abandonado à morte. Jovens de bem, meninos educados, incapazes de fazer mal a uma mosca, essa é a ideia dos seus papás protectores, que pouca educação souberam dar a seus filhos, para além de comida para não morrerem à fome. Infelizmente anda por aí muitos jovens de cabeça vazia, vazia de princípios, de valores humanos, e principalmente de humanidade. Jovens egoístas, habituados a terem o que querem e quando querem, que não sabem ouvir um "não" na vida, e que ao o ouvirem, encenam os seus teatros para conseguirem assim o pretendido. Gente que vive entretida em vidas vazias mas cheias de inutilidades e futilidades. Por cá ainda existe o art.º 132.º C.P. que prevê a pena de 12 a 25 anos de prisão, quando o agente revelar especial perversidade e censurabilidade no acto cometido, neste caso, contra pessoa indefesa, incapaz de reagir. Entende-se por especial censurabilidade o distanciamento de valores do agente dos valores dominantes da sociedade; e por especial perversidade as características intrínsecas ao próprio agente que fazem com que a sua personalidade traduza um comportamento mais culposo. Só falta agora chegarem os relatórios dos senhores psicólogos, adeptos da conversa dos coitadinhos, em como os agentes imediatamente transformados em vitima, tiveram uma infância infeliz e nunca teriam agido desta maneira se não estivessem eles também embriagados e que tudo não passou de uma brincadeira sem intenção de matar. Pois é, os meninos não quiseram matar ninguém, mas a falta de respeito e o deixar estar sem querer saber o que poderá acontecer, prevendo que a pessoa possa morrer, é indiciador de dolo eventual, e aqui já teremos preenchido o dolo exigido pelo crime de homicídio. Por dolo eventual (uma das três formas de dolo) entende-se quando o agente prevê uma consequência danosa como resultado do seu comportamento, e continua a agir aceitando e conformando-se com a possibilidade de tal ocorrer num género de "aconteça o que acontecer, faço à mesma, quero lá saber"!

É a sociedade que temos, quando os valores humanos não se impõem, e prevalece a promiscuidade e o vazio da alma.

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